A doçura de Mia Couto
A doçura de Mia Couto é extravasante.
Todas as letras são suaves, todas as palavras como que murmuradas, em vez de escritas.
Já tinha lido "Venenos de Deus, Remédios do Diabo" e ficado presa da sua escrita, das suas histórias, das suas amendoadas histórias.
"Na berma de nenhuma estrada" é um livro de contos, bem pequeninos, alguns deles com o seu quê de magia.
Atentem bem nestes inícios de alguns deles:
_ Era uma vez o menino, tão minimozito que todos os seus dedos eram mindinhos. Dito assim, fino modo, ele, quando nasceu, nem foi dado à luz mas a uma simples fresta de claridade.
_Diamantinha chorava tão bem que as pessoas vinham de longe e lhe pediam- chora por mim, Diamantinha.
_Estou aqui no sopé da estrada, à espera que alguém me leve. Um qualquer, tanto faz. Basta que passe e me leve. É meu sonho antigo: sair deste despovoado, alcançar o longe.
Ou este final:
_ Debruçando-se sobre a cadeira do marido, Lucinha beija-lhe longamente a testa. Tão longamente que ele adormece, se afundando no rio do tempo, mais denso que a própria vida.